Lama e Lamúria

Quase dois anos e meio decorridos e vítimas fatais.
Os moradores arrancados da querida morada,
Tiveram que deixar seus objetos pessoais,
Porque foram saqueados pela Lama ingrata.
Os dados são esses.

De rejeitos tóxicos era o vazamento
Que após exterminar o distrito e um Rio inteiro,
Chegou ao mar e apagara com as ondas o tormento.
O maior acidente ambiental e não se ouve mais a respeito.

A memória local tem voz e soa potente
Dizem “não” à extração do minério inconsequente.
O esquife de Lama encerrou 19 corpos.
As famílias e os amigos vagam com os corações esfacelados.
Os fluxos brutais do rompimento arrasaram a terra sobremaneira
E, com equivalente ímpeto, o trauma corre na alma guerreira.
Mas a voz perde força e os olhos soçobram no vazio.
Bento Rodrigues é um distrito fantasma.
A dispersão compulsória dos moradores não extinguiu o miasma.

Por toda parte, ouve-se a lamúria proveniente da Lama espúria.
Mesmo quando o silêncio reina soberano no local abandonado,
Ouve-se o caos instaurado apontando para ruptura.
A água inda é turva, mas a memória não se curva.
Memória de tempos felizes e memória de dores incontáveis.
Lembrança da Lama que encobriu outras lembranças.

A Melancolia, jovem dama, é a nova habitante da região.
Mal chegou e a todos envolveu com seu abraço frio de granito.
Não há o que fazer, os antigos moradores se viram nela espelhados.
O corpo pende sobre o próprio peso, com os prazeres estilhaçados
E as esperanças minguadas, não sente mais o calor do dia,
O Sol é como um astro gélido a dissipar sua energia arredia,
A mente perdeu a força prospectiva, nada vê adiante.

Lucro e luto entram num congélido embate.
De que Vale reconstruir se lucro algum há no porvir?
O lucro é consorte da morte e molda a sorte
Dos homens que definham mentalmente cansados
E são lacerados pelo capital, seres reificados
Que valem menos que uma cédula de papel.

Bruna Xavier de Moro